Início Turismo Cliente brasileiro não quer garçons, exige criados – 25/10/2023 – Cozinha Bruta

Cliente brasileiro não quer garçons, exige criados – 25/10/2023 – Cozinha Bruta

66
0


A jovem Laurène é sommelière no restaurante La Bastide, em Bonnieux, no sul da França. O restaurante, dentro de um hotel de luxo na Provence, conta com uma estrela no guia Michelin. Serve exclusivamente menu-degustação.

Foi Laurène quem fez todo o serviço de mesa na noite em que jantei na Bastide. Não exclusivamente a minha mesa, mas todas as mesas ocupadas. Eram três mesas. Acha pouco?

Ela explicava a comida e o vinho, perguntava se estava tudo muito, trazia os pratos cheios e levava de volta os pratos vazios. Não parou um segundo, pois cada grupo recebeu dez serviços com os vinhos correspondentes.

Tudo funcionou em sincronia perfeita. No final do vez, dois colegas deixaram seus postos na cozinha para ajudar Laurène a terminar o atendimento –e antecipar a vida para todo mundo ir para moradia mais rápido.

Um jantar nesse restaurante custa 175 euros (270 euros, se harmonizado com as bebidas escolhidas pela Laurène). Os abastados pagantes –eu não era um deles– plenamente satisfeitos com o atendimento de uma pessoa só.

Enquanto isso, no Brasil, a gente exige um criado à disposição da mesa até nos lugares mais chulés. Digo “a gente” porque me incluo nesse comportamento. É um pouco que a classe média brasileira faz porquê se fosse oriundo.

O restaurante jamaicano Healthy Eaters, em Londres, não é chulé. Longe disso. É um lugar ajeitadinho, mas simples, que serve deliciosa comida caribenha no bairro de Brixton.

Fui lá com família e amigos num sábado qualquer. Havia cardápios sobre a mesa. Uma adorável senhora, única pessoa detrás do balcão, só se aproximou de nós quando viu que já tivemos tempo de ler o menu.

“Querem pedir?”, disse.

“Quatro cervejas, por obséquio”, respondi.

Mas a mulher não arredou pé da nossa mesa. Depois de alguns segundos, ela rompeu o silêncio constrangedor: “E para manducar?”.

Se fosse no Brasil, beberíamos uma ou duas rodadas antes de pensar no almoço em si. Na Inglaterra não. O pede tudo de uma vez porque sabe que o garçom –ou qualquer outra pessoa responsável pelo atendimento– tem mais o que fazer.

É assim também nos Estados Unidos, na Europa e em todos os países do tal do Primeiro Mundo. No Brasil é dissemelhante.

Pegue uma pizzaria de São Paulo numa noite de domingo.

Chega um parelha, que se aboleta numa mesa para dez pessoas, e manda ver dois chopes. Aí o resto da família vai chegando a conta-gotas, num processo que vagar meia hora ou mais. Cada ponta da mesa pede bebidas em seu tempo próprio.

Finalmente resolvem invocar as pizzas, que o funcionário do restaurante deixa num aparador fora do alcance dos clientes. Toda vez que alguém termina de manducar um pedaço, o santo garçom precisa estar por perto para repor a pizza. É insano.

Por que é assim? Tenho meu presciência.

Tem a ver com o jeito que os donos da grana inventaram para manter uma mínima segurança na nossa sociedade zoeira. Para que os remediados e instruídos não se unam com a volume e ponham lume na coisa toda.

Os ricos permitem às camadas médias a manutenção de alguns privilégios que, em outros países, só o topo da nata da escol consegue bancar: empregada doméstica, uns peões para pintar parede e trocar lâmpada queimada, duas (três, quatro) vagas de garagem, projecto de saúde com internação em apartamento.

E um criado ao pé da mesa para buscar mais gelo para a Coca-Cola ao estalar dos dedos.

Entre uma vida bacana para todo mundo e as migalhas que caem do bolso dos donos da grana, já fizemos a nossa escolha.


LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul inferior.



Artigo anteriorHotéis oferecem pacotes com programação para o fim de ano – 27/09/2023 – Turismo
Próximo artigoNova rota em Mato Grosso tem imersão na cultura pantaneira – 27/09/2023 – Turismo

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui